Mês: setembro 2012

O que os olhos não veem o coração não sente

Este é um dos muitos jargões populares que perdura por séculos, através da tradição oral. Creio que uma das razões de sua sobrevivência está na reação imediata do pensamento que tenta casar a afirmação com algumas experiências da vida, ou mesmo com algum ensino bíblico (para os cristãos).

Verdadeiramente os olhos aceleram certas realidades, enviando à mente informações acerca do que contemplam. Quando pequeno, escondido de meus pais, peguei uma espingarda de chumbinho e sai para caçar em um sítio. Coloquei o chumbinho e tentei fechar a espingarda, mantendo os olhos atentos na mata, tanto pela procura de uma vítima como pela preocupação de meu pai chegar. Não obtive sucesso, e, mesmo sem olhar para a espingarda, abri e fechei novamente, agora com sucesso. Em pouco tempo minha mão coçava, e então, depois de alguns minutos, quando olhei para mão direita, estava toda ensanguentada, por ter sido perfurada na primeira tentativa de fechar a espingarda. Imediatamente a coceira virou dor e desespero. Miseráveis olhos que cagoetaram à mente o que havia acontecido! Quando nossa mente recebe a mensagem daquilo que nossos olhos veem, reagem imediatamente, enviando mensagens para o restante do corpo.

Assim como na questão física, sabemos que quando nossos olhos não contemplam o pecado, deixando de ser tentado por este, não sofremos os males e angústias provenientes da tentação. Muitos testemunham da dificuldade de se esquecer das imagens vistas em sites pornográficos, por exemplo. Aquelas imagens são usadas pelos meios pecaminosos enraizados no homem para incomodar e conduzir à experiência particular. Este sofrimento, da forma intensa como procede, não aconteceria se os olhos não tivessem contemplado as imagens.

Porém, em alguns casos, esta afirmação não pode ser aplicada com sucesso. Há situações na vida que enxergar ou não, não impede os resultados. Talvez, em alguns casos, seja ainda pior não enxergar, dificultando a possibilidade de correção. Um cônjuge traído não precisa dos olhos para sentir a traição. Talvez precise para confirma-la; para entender o porquê do distanciamento de seu cônjuge; para entender a diminuição, ou mesmo o sumiço, da procura sexual; para entender a fuga do companheirismo; dentre outras coisas. Em casos assim o coração sente mesmo sem os olhos verem, aguardando somente sua confirmação através destes, ao contemplar; ou dos ouvidos, ao ouvir. Em ambos os casos o resultado é doloroso; porém, não uma surpresa para o coração que já sofre.

Em alguns casos o ideal seria o contrário do ditado – ver o quanto antes para sentir. Sentir de uma vez, e não aos poucos, como numa estrada amarga, gerando confusão na mente e incertezas nos sentimentos. Quanto antes os olhos contemplassem a traição, ou os ouvidos ouvissem sua declaração, maior as chances de um processo de recuperação do relacionamento – perdão, reflexão, diálogo, decisões, e retomadas. Nesse sentido, o ideal não seria a “fuga” proposta pelo ditado, mas o confronto. Afinal, fugindo ou confrontando haverá dor. Porém, fugindo a pessoa sofrerá mais em longo prazo, retardando a certeza e o início de um processo de restauração; e aumentando a possibilidade do envolvimento de seu cônjuge com a outra pessoa. Já confrontando a pessoa inibirá um longo período de envolvimento às escondidas de seu cônjuge, e sofrerá de uma vez a dor causada pelo pecado, que pode ser consertado por corações habitados pelo Espírito de Deus.

Perceba que nem sempre a “fuga” é a melhor opção. A razão para esse ditado servir de referencial para muitos, é o desejo de fugir da dor. Mas, fugir da realidade é uma opção que aliena, mascarando as relações – entre pessoas e coisas. O ideal é viver autenticamente, mesmo com a possibilidade de a dor bater às portas; afinal, é melhor viver do que representar.

Que seus olhos e seu coração harmoniosamente sejam do Senhor, sempre! “Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração; o mandamento do Senhor é puro e ilumina os olhos” (Salmo 19.8).

Identificação

“E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as” (Efésios 5.11).

Duas ações:

Uma em tom negativo: Não ser cúmplice.

Não planejar. Não apreciar. Não participar. Não usufruir de seus resultados. Não se deixar levar por aquilo que não condiz com a realidade de alguém que é igreja; mas sim com a realidade de quem é mundo.

Outra em tom positivo: Reprovar as obras das trevas.

Como o fazemos? Através da identificação com a luz, que é Cristo: “Eu sou a luz do mundo; quem me segue não andará nas trevas; pelo contrário, terá a luz da vida” (João 8.12). É mais do que simplesmente reprovar verbalmente. É toda ação (mesmo silenciosa) que expõe o erro, o pecado; e identifica a pessoa com outra realidade: “Pois todo aquele que pratica o mal aborrece a luz e não se chega para a luz, a fim de não serem arguidas as suas obras. Quem pratica a verdade aproxima-se da luz, a fim de que as suas obras sejam manifestas, porque feitas em Deus” (João 3.20-21).

É dessa forma que nos tornamos luz do mundo. Ao nos aproximarmos de Cristo, evidenciando nossa identificação com ele, iluminamos, realçando Sua luz aos outros. Não temos luz própria, pois nossa fonte é a luz de Cristo; assim, tudo depende de nossa identificação com ele.

Perceba, no exemplo abaixo a diferença de não ser cúmplice, reprovando o que nos é oferecido:

1. Não, obrigado! Não bebo, porque não gosto. Ou, não bebo porque não quero. Ou, porque não estou me sentindo bem. Ou, qualquer outra razão que omita a verdadeira razão; que omita sua identidade com o Senhor.

2. Não. Não bebo porque sou santo. Isto mesmo, minha identidade com Cristo me leva a evitar aquilo que não traz aperfeiçoamento de meu caráter. Aquilo que não contribui para os meus relacionamentos. Aquilo que não contribui para minha adoração ao Senhor que me salvou.

Não, simplesmente, não bebo porque minha igreja não deixa. Ou porque meus pais são crentes. Ou qualquer outra desculpa. Mas, a identificação consciente e desejável com Cristo.

Percebe a diferença? A primeira resposta possibilita evitar a prática do pecado; mas, não a reprova, como a segunda resposta; o que pode implicar em pecado – se, eu não faço aquilo que devo fazer, logo estou pecando. Assim, não ser cúmplice; mas, antes, reprovar, implica em se identificar com Cristo; identificando-se como santo.

Você é santo? Precisa, então, viver como santo.