Deus ou deus?

 

Temos um rei justo e implacável na administração de sua lei; porém, de escasso sorriso e de inimaginável abraço despretensioso em algum humilde que não o tenha merecido por uma tarefa frutífera e impecável ao Soberano.

 Temos um rei incrível! Forte, poderoso, vencedor de todas as possíveis e impossíveis batalhas, em quem podemos descansar na certeza de não existir poder superior para nos abater. Um rei santo! Tão santo; tão separado e irrepreensível que parece infinitamente distante de nossa insignificante realidade cotidiana. Ele é lindo! Perfeito! Porém, incomunicável em misericórdia e bondade.

Este parece o retrato de Deus para alguns. Um Deus sério, até mesmo sisudo, atento com um porrete em mãos para atingir a qualquer um dos seus que não siga suas recomendações, registradas em seu manual – a Bíblia.

O problema não está nos atributos identificados nas Escrituras acerca de Deus – Justo, Forte, Poderoso, Majestoso, Santo, dentre outros; mas, sim, na interpretação de alguns que redefine tais atributos à luz de questionável conhecimento e limitada formação. Para estes, Deus torna-se sério e correto; porém, feio e sisudo, possuindo séria dificuldade em demonstrar amor, além de absurda falta de realidade e de bom senso.

Jesus Cristo foi identificado como a revelação perfeita de Deus aos homens (Hebreus 1); e quando o consideramos nos evangelhos, reconhecemos um Deus repleto de compaixão, perdoador, com insistente visão de futuro para aqueles que eram limitados. Chamou seus discípulos e suportou suas idiotices porque sabia ser algo passageiro que desapareceria com a maturidade por vir – de discípulos a apóstolos. Olhou para a pecadora abordada em adultério e a perdoou por enxergar futuro para ela, além de reconhecer pecado em todos os seus acusadores.

E seus seguidores (a tempo e fora de tempo) deram sequência à sua conduta. Paulo afirmou que Deus nos salvou estando nós mortos em nossos delitos e pecados, quando andávamos aprisionados em meio a nossa rebeldia ao Senhor (Efésios 2.1-3). Os olhos do Senhor consideravam nossa realidade pecaminosa, mas valorizavam o futuro em meio à salvação e formação, através de Seu Espírito em nós.

Por que alguns insistem em proclamar um deus feio e sisudo que não perdoa as falhas e limitações e, ainda, tem séria dificuldade em reconhecer a realidade das pessoas? Por que alguns insistem em estabelecer uma estrutura religiosa baseada em uma visão de um deus indesejável, brigão e orgulhoso?

Talvez, porque o Deus revelado nas Escrituras ainda não tenha se tornado seu Deus. Talvez, porque insistam em manter-se surdo e cego para Sua revelação, impondo suas próprias vontades e definições acerca da vida desejada por Ele, revelando a pecaminosa disposição em ocupar Seu lugar ao definir o que deve ser considerado e como deve ser considerado. Talvez, porque o inimigo, ainda, os tenha mantido numa redoma de religiosidade, inculcando a falsa impressão de adoração, mas, na realidade, os mantendo distante da espiritualidade expressada nas Escrituras que estimula ao amor e a humildade.

Deus é Santo, Justo, Soberano, distante de qualquer pacto com o pecado; mas, isto não o torna feio, carrancudo, brigão, separado das pessoas. Deus é amoroso, repleto de compaixão, de misericórdia e de bondade. É um Deus repleto de alegria e que se compraz em criar oportunidades para a mudança esperada. É Deus de segundas oportunidades e que, em hipótese alguma, parece se alegrar com a derrota dos seus, movida pelo pecado.

Adoremos ao Senhor revelado nas Escrituras e, consequentemente, amaremos. Mas, se adorarmos ao deus criado pelos homens em sua religiosidade, aprenderemos a ser distantes e horrorosos. Adoremos ao Senhor!

Razões para não cooperar

“Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima” (Hebreus 10.25).

Que motivo levaria o autor aos hebreus a fazer tal exortação? Evidentemente, o fato de alguns, por razões diversas, não congregarem. Pois bem, quais seriam as razões para o afastamento? Você consegue enxergar razões para o afastamento, e a não cooperação? O que levaria ao esfriamento espiritual?

Há razões aceitáveis, e recomendáveis para o afastamento, como o desvio herético e doutrinário. Mas, até nesses casos, o afastamento deve ocorrer após sérias e corretas tentativas de mudança. Há, ainda, a razão de não se adequar ao estilo da igreja (sem nenhuma agressão aos princípios eclesiásticos expostos nas Escrituras); nesse caso o indivíduo deve mudar de igreja e não lutar para mudar a igreja.

Há as razões equivocadas para o afastamento, como o estar chateado com algum irmão (Mateus 18.15ss); ou o discordar da decisão da maioria (Atos 16.4-5; Filipenses 2.1-4); ou o discordar em algum aspecto da liderança (Hebreus 13.17); ou mesmo ter sido preterido em alguma escolha (Filipenses 2.5ss). Provavelmente algumas destas compunham as razões que levaram os hebreus a se afastarem do convívio da igreja. E, por isso, o autor da epístola os exorta, mostrando que não são razões aceitáveis para o afastamento.

Mas, quero destacar algumas das principais razões que levam crentes a se afastarem de suas igrejas; e, consequentemente, do Senhor.

1. Pecado.

Escondido, secreto, criado, alimentado, e não confessado ao Senhor. (Hebreus 3.12-13) Isto esfria a alegria, e faz a pessoa valorizar as falhas e erros, mesmo quando estas verdadeiramente não existem. Exemplos: (1) A pessoa tem inclinação à infidelidade, e, então, procura erros para não dar os dízimos e as ofertas. (2) A pessoa tem inclinação a não ser assídua e participativa, e então, procura razões para não estar sempre nas programações. Por que a pessoa age assim? Porque é uma forma de esconder, ou de diminuir seu próprio erro. É uma tentativa de enganar a própria mente. Por isso a exortação para renová-la (Romanos 12.1-2).

2. Hipervalorização do “eu”.

Quando a pessoa se vê superior às outras, e acha que merece ser priorizada quanto às suas sugestões, escolhas, etc. Quando a pessoa tem cuidado exagerado com sua imagem, e não admite ser preterida, crendo que assim está sendo exposta ao ridículo. Quando a pessoa tem dificuldade de convivência, não sabendo ouvir; mas exigindo ser ouvida. Não sabendo ajudar, contribuir; mas exigindo participação efetiva dos outros diante de algo que comanda. Encarando tudo como pessoal – se alguém foi contra a alguma ideia, é contra a sua pessoa; logo, muda, inclusive, sua forma de agir para com ela.

3. Imaturidade.

É quando a pessoa não tem razão específica, não tem sequer argumentos; mas é contra. Não se dá nem a experimentar aquilo que está sendo proposta; simplesmente é contra. O esquisito é que você pergunta o porquê, e as respostas normalmente são: porque é errado; não é bom; não é legal; vai atrapalhar; etc. Nada realmente com conteúdo e que processe reflexão para, quem sabe, uma mudança de rumo. E o pior é que tendem a ser exagerados, buscando fortalecer sua posição: Não dá certo, todo mundo acha; a igreja inteira, quando na realidade é ela, ou talvez mais duas ou três pessoas. (1Pedro 3.8-12).

4. Visão errada do motivo pelo qual vivemos, agimos e cultuamos.

“E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai. Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens” (Colossenses 3.17, 23). Nossa motivação é o Senhor. Não pode ser alguém, a instituição, ou a estrutura administrativa; pois, neste caso incorremos em dois erros: (1) Errar no alvo de nossa adoração e dedicação. (2) E certamente se decepcionar em algum momento, pois seres humanos, e tudo aquilo que criam possuem falhas. Dessa forma corre-se o risco de perder a motivação.

A maturidade espiritual está em não precisar de razões terrenas, falíveis e passageiras para adorar ao Senhor, servindo-o com dedicação. O meu servir, o meu dizimar, o meu ofertar, o meu congregar, o meu participar, tudo é minha forma de adorar ao Senhor; por isso, devo procurar fazer sempre o melhor, pois é para Ele.

Salvos para glorificar

 

A salvação é pela graça, no sentido de que é um presente de Deus a quem mereceria o juízo eterno. Não é por merecimento; não é por aquisição; não é por troca de favores. Em sua eternidade, Deus amou e nos escolheu para seu povo. Assim, planejou, e providenciou para que seu plano fosse executado. Isso está revelado em textos como o de Isaías (43.10-13): “Vós sois as minhas testemunhas; diz o Senhor, o meu servo a quem escolhi; para que o saibais, e me creiais, e entendais que sou eu mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá. Eu, eu sou o Senhor, e fora de mim não há salvador. Eu anunciei salvação, realizei-a e a fiz ouvir; deus estranho não houve entre vós, pois vós sois as minhas testemunhas, diz o Senhor; eu sou Deus. Ainda antes que houvesse dia, eu era; e nenhum há que possa livrar alguém das minhas mãos; agindo eu, quem o impedirá?”.

Essa salvação não se deu com o fim de ficarmos livres; nem com o objetivo de que, sendo livres vivêssemos autonomamente. Não há liberdade; nem espaço para libertinagem (modo libertino, irresponsável de viver). Assim há uma salvação que nos amarra a um plano previamente estabelecido; cujo caráter é definido pelo autor do plano – Deus.

Seguindo o entendimento básico do texto, nossa tarefa, incluída em nosso novo estado, é a de testemunhar. E este testemunhar deve ser amplificado à luz do que a Revelação exige. Então, objetivamente, consideremos suas implicações.

1. Implica em adoração.

Como expõe o texto: “vós sois minhas testemunhas”. Esta palavra tem a ver com a esfera legal ou judicial. Aquele que pode confirmar legalmente. Aquele que assina um acordo. Aquele que pertence ao contexto do tratado. E nesse caso somos diretamente os beneficiados, pois somos testemunhas da ação de Deus em nosso favor; isto é, recebemos os benefícios de um acordo gracioso, e podemos, então, declarar nossa identidade e os benefícios recebidos por sua consequência. Por isso, ele afirma: “para que o saibais, e me creiais, e entendais que sou eu mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá”.

 O resultado desta ação graciosa de Deus, e dos benefícios que chegam até nós, deve ser testemunhado em adoração. Reafirmar a identidade do Salvador e beneficiador; e dispensar-lhe gratidão. Assim, a adoração está ligada, primeiramente ao conhecimento de Deus. É necessário conhecer aquele do qual temos de testemunhar. Por isso, a ênfase no texto: “para que o saibais, e me creiais, e entendais que sou eu mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá. Eu, eu sou o Senhor, e fora de mim não há salvador”. Sem conhecer é impossível falar de alguém, quanto mais testemunhar acerca de quem é a pessoa, e do que ela faz.

A adoração também está diretamente ligada ao ter uma experiência de relacionamento com Deus; pois ela também implica em espírito de gratidão. Isto é, compreender que os benefícios recebidos vêm do Senhor. Não somente a exclusiva salvação, mas também seu desenvolvimento – libertação da escravidão do pecado; capacidade de discernir; visão amplificada do mundo e da vida; poder para mortificar os feitos da carne; poder para mudanças profundas no caráter; poder para perdoar, para amar, para cuidar, para doar-se, entre tantos outros benefícios. Somente em experimentar tais coisas, tornar-se possível adorar ao Senhor com espírito de gratidão. É o que Paulo exorta aos colossenses (3.16): “Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo; instruí-vos e aconselhai-vos mutuamente em toda a sabedoria, louvando a Deus, com salmos, e hinos, e cânticos espirituais, com gratidão em vosso coração”.

2. Implica em proclamação.

Como prova viva da ação poderosa e benéfica de Deus, devemos proclamar tais coisas. Proclamar a ação soberana do Senhor: “Ainda antes que houvesse dia, eu era; e nenhum há que possa livrar alguém das minhas mãos; agindo eu, quem o impedirá?”. Eu sou testemunha, nada pode impedir sua determinação. Interessante a forma como o texto é concluído. Uma pergunta que pressupõe uma reação imediata das testemunhas, respondendo que absolutamente nada pode impedir a ação do Senhor, já que ele é Senhor; e que suas testemunhas são prova viva de sua ação no mundo.

Escolhi o texto em Isaías, representando o Primeiro Testamento, para mostrar que esta realidade revelada se dá em toda a Revelação; e, portanto, se estende tanto a Israel como a Igreja. É a realidade daquele que pertence ao Senhor; daquele que se torna parte de Seu povo. E para comprovar esta realidade estendida também no Segundo Mandamento, quero considerar o texto de 1Pedro 2.9-10: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia”.

 Esta proclamação exortada por Pedro tem duas implicações. Primeiramente, refere-se, especialmente a algo a ser compartilhado aos incrédulos, aos de fora do povo. A palavra usada por Pedro tem o significado primário de “contar para fora”. Logo, o foco aponta prioritariamente para aquilo que a igreja chama de evangelização. Mostrar, expor Deus aos outros. Esta perspectiva segue a revelada do Primeiro Testamento, como no texto de Isaías que consideramos.

E uma segunda implicação desta proclamação é encontrada no significado secundário da palavra usada por Pedro de “proclamar por toda a parte, publicar completamente”. O foco aponta para uma proclamação que para ser completa deve incluir o todo de quem a proclama; logo, deve ser algo que vá além do discurso, incluindo sua experiência de vida.

É por isso que o evangelho soa como uma proclamação escandalosa para muitos, quando misturado com um testemunho que destoa de seu conteúdo. É um escândalo para qualquer um o apresentar o Deus Santo e transformador da vida, tendo uma vida envolvida em pecado e um caráter duvidoso, ou claramente desqualificado.

Por isso que o Senhor através de Isaías afirma que: “Eu, eu sou o Senhor, e fora de mim não há salvador. Eu anunciei salvação, realizei-a e a fiz ouvir; deus estranho não houve entre vós, pois vós sois as minhas testemunhas, diz o Senhor; eu sou Deus”. É preciso ser testemunha. É preciso que a vida testifique as palavras de que Deus salva e transforma. E de que vale a pena.

É por isso que o Senhor através de Pedro afirma que: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz”. Houve mudança em nossa identidade, em nossa participação coletiva; e esta mudança deve redundar em proclamar o Senhor da mudança.

3. Implica em servir.

E, como parte deste testemunho, somos conduzidos a servir. O termo é aqui usado tanto como ênfase – testemunhamos ao servir, servimos ao testemunhar – quanto para especificar nossa ligação com Cristo, o Servo escolhido (Isaías 42.1; 53.11).

E, seguindo seu exemplo, este servir implica em atuar em benefício de Seu povo, de Seu corpo; hoje, a igreja; naquele tempo, Israel. “Vós sois as minhas testemunhas; diz o Senhor, o meu servo a quem escolhi”. A ideia de servir está difundida em toda a Revelação. O próprio Senhor Jesus Cristo afirmou que isto estava implícito em seu ministério, e que o mesmo se daria a todos os seus (Mateus 20.26-28).

E, por isso, os apóstolos, como Pedro, ensinou a igreja a fazê-lo (1Pedro 4.10-11). O servir está implícito em ser povo de Deus; em ser discípulo de Cristo, e ter de fazer como o Mestre. A capacidade de servir está incluída no projeto do Senhor (dons, v.10). E o propósito deste servir é o mesmo da proclamação e adoração: glorificar a Deus (v.11).

Fomos salvos para quê?

Não fomos salvos simplesmente para sermos libertados da escravidão do pecado, ou livrados da condenação eterna. Não fomos salvos para perambularmos pelo mundo, admirando, suspirando e ansiando por coisas que preenchem a alma daqueles que não vivem com Deus; como se estivéssemos desconectados dEle.

Fomos salvos para servir ao Senhor e aos seus propósitos. Fomos salvos para testemunhar do Salvador, proclamando sua glória e cantando sua graça; e, salvos para servir, em conformidade com o dom que recebemos.

Este tem de ser o propósito de nossa nova existência. E, não há outro sentido e propósito para nós, revelado nas Escrituras.

O quanto sua vida e seu servir tem redundado em glorificação ao Senhor?

Por quê?

Pergunta que revela a existência de um enigma, algo não entendido, e que geralmente dói. É preciso que o não-entendido doa para que surja a pergunta. Há muitas coisas que não entendemos, mas elas não doem. Não doendo, a pergunta não surge. Fazemos a pergunta numa tentativa de diminuir a dor, para dar sentido à dor.

– Por que você falou desse jeito?

– Por que não me ligou?

– Por que quer terminar o relacionamento?

Quem pergunta “por quê?” deseja uma resposta. Quer uma explicação, pois uma dor explicada é uma dor que dói menos (às vezes). Mas existem situações em que a pergunta surge sem esperança de resposta. E, mesmo que esta fosse dada, de nada valeria.

– Por que morreu?

– Por que nos deixou, partindo para o nunca mais?

– Por que não passei?

Na realidade não se espera uma resposta. O “por quê?” é um grito de protesto dirigido aos céus, um urro que nenhuma resposta explicará ou consolará. Grito que se grita diante da dor sem consolo. Em horas assim não há ateus. Se a cabeça diz que Deus não existe, o coração afirma que tem de existir.

Respostas teológicas surgem em ritmos divergentes, porém, apontando para uma mesma direção, numa tentativa de declaração: a explicação das razões baseadas no relacionamento entre o Deus onipotente (para alguns, transcendente, para outros, imanente, e ainda para alguns, tão um quanto o outro) e o homem, tão carente.

Diante de um “por quê?” a resposta divina é ansiada, porém, o que menos se espera – e é exatamente o que mais ilude e faz doer – é por uma resposta humana travestida como divina. É a postura de consciente ou não servir de porta-voz, ou intérprete do Criador; assumindo, assim, sacerdócio exclusivo. É a loucura de achar que se não houver uma resposta a todas as nossas perguntas, Deus perde seu posto e função de Soberano. É a tentativa ousada de domesticar a Deus, levando-o a concordar e a discordar com toda a vontade do abusado adestrador. Respostas assim causam mais sofrimento, além de orientar mal, guiando seu ouvinte a uma crença insana.

O Deus revelador, em muitos momentos em sua Revelação, ficou em silêncio, deixando o homem sem resposta para algumas indagações. E, mesmo, revelando somente aquilo que achou interessante, necessário. É mais fácil acreditar na limitação e ignorância do homem do que na impossibilidade do Criador. Isto nos ensina que há resposta para tudo, porém, que nem sempre deve ser revelada.   Assim, há espaço para que alguns dos meus “por quê?” fiquem no ar, como desabafo, ou mesmo dúvida. Melhor assim, do que as respostas humanas travestidas de divinas.

De qualquer forma, eu estou aqui, Deus também, além de lá; e continua a me guiar; respondendo ou não ao meu “por quê?”.

Homenagem ao meu Rio de Janeiro

Homenagem ao meu Rio de Janeiro

Aniversário de 448 anos da Cidade Maravilhosa

Tendências religiosas em nossos dias

Pluralidade

A nomenclatura em voga é Ciência da Religião. A preocupação principal se resume em dois pontos: O primeiro, qual seria a terminologia adequada – Ciência da religião, ciências da religião ou ciências das religiões? O que não é simplesmente uma questão de título, mas sim de delimitação do campo (prefiro Ciência da religiosidade). O segundo ponto é em não abrir espaço para a velha teologia confessional mascarada, ou maquiada como ciência. Isto porque ciência da religião é o estudo das hierofonias, ou seja, o sagrado em suas múltiplas manifestações. Este sagrado é um elemento estrutural da consciência e não uma fase da história dessa consciência. Nos mais arcaicos níveis de cultura, viver como ser humano é em si um ato religioso, pois a alimentação, a vida sexual e o trabalho têm um valor sacramental. Por outras palavras: ser – ou, antes, tornar-se – um homem significa ser ‘religioso’”[1]. O Brasil, pela peculiaridade de suas crenças, de seu universo mítico-religioso, é um celeiro para estudiosos que querem se dedicar a pesquisas do fenômeno religioso.

Todas as escolas que hoje oferecem Ciência da Religião como disciplina, seguiram a trajetória que teve como ponto de partida um departamento de clérigos (mesmo em universidade pública) e uniconfessional, para, em seguida, passar por um processo de desclericalização e descatolização ou desprotestização; alcançando atualmente a fase da desmasculinização. Todo este processo revela que vivemos não só um tempo de mudança, mas de mudança de tempo. E este tempo é fortemente marcado pelo pluralismo religioso. O que indica a volta do sagrado, porém numa nova roupagem, mais livre, solta, móvel, sem residência fixa [em sua visão], na realidade sem referencial [em minha visão].

Para muitos, a teologia acorda de seu sono dogmático, deitada há séculos, para se deixar ser interpelada pelo surto do sagrado, sendo obrigada a repensar sua linguagem para falar a um mundo plural. Assim, a teologia necessita renovar-se frente ao novo paradigma do pluralismo religioso. Devendo se enveredar pelo caminho da hermenêutica da vida humana, isto é, uma teologia do sentido ou do significado. Fazendo do teólogo um mero caçador de sentido.

Ciência da religião, diferentemente da teologia, não se debruça sobre o dado revelado, mas sobre o fenômeno religioso. Não traz uma abordagem confessional do fenômeno, mas uma abordagem fenomenológica. Para os novos orientadores religiosos, passamos do diálogo das culturas para o diálogo das religiões. Isso implica em abandonar um paradigma exclusivista para adotar um novo paradigma pluralista, isto é, deixar de ser Igreja detentora da verdade para encontrar-se com as diversas religiões, enriquecendo-se com as mais diferentes formas de expressão do sagrado.

Esta linha de compreensão, e imposição, sobre o ensino religioso revela a essência da religiosidade de nosso tempo: alvo e método; aonde se quer chegar e como chegar. Simplificando, vivemos imprensados por uma disposição em aniquilar com a verdade, abrindo espaço para as verdades, mesmo que incoerentes. O inimigo comum não é a(s) inverdade(s), mas sim a verdade única, absoluta, asfixiadora dos prismas particulares, das diversas intenções acadêmicas, políticas, econômicas e espirituais.

Tudo isso forma uma atmosfera facilitadora para novas tendências; que, em muito, são velhas tendências em novas roupagens; agora, mais corajosa em se expor, devido à atmosfera atual, como o Teísmo aberto: a ideologia mais coerente da escola mais incoerente da teologia – o arminianismo; que tenta, assim, construir coerência para a incoerência.

Todas as tendências tornam-se possíveis pelo fato do foco estar não no âmago do conhecimento crido, ensinado e defendido; mas sim na possibilidade de se crer em qualquer coisa, por mais absurda que seja. A beleza a ser entendida e conservada que, segundo eles, é suficiente para a manutenção da crença está no religioso; no produto final da crença naquele que a exerce. Assim, não importa a religião; ou mesmo o conteúdo desta (sua teologia); mas a liberdade do exercício em se crer. Isso revela a cicatriz que a Igreja deixou nas sociedades no decorrer de sua história pré-moderna. Há um pavor de religião institucionalizada, mas uma paixão sobre a religiosidade individual. Seria uma forma distorcida de se aplicar o verso: “Tudo é possível ao que crê” (Marcos 9.23b).

Ódio, medo, aversão, são alguns dos sentimentos mais comuns entre os estudiosos para com a Igreja, como maior representante histórica da religião institucionalizada. É importantíssimo que os teólogos cristãos de nossos dias conheçam a história, assim como seus resultados, incluindo a época em que vivemos, para, então, serem corretos em seu proceder no educar a igreja, no formar novos líderes, e no defender a fé.


[1] ELIADE, M. Tratado de História das Religiões. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 7.

Formadores de caráter

218329“E vós, pais, não provoqueis vossos filhos à ira, mas criai-os na disciplina e na admoestação do Senhor” (Efésios 6.4).

“Papai, quero ficar com você”. Esta declaração de um menino de três anos de idade foi feita três vezes antes que o pai levantasse os olhos do que fazia. O pai o havia mandado para a cama diversas vezes. Toda vez, ele dizia simplesmente: “Papai, quero ficar com você”. Daí, para conseguir a atenção do pai, fez uma dúzia de perguntas. Quando o pai parou de escrever, ele perguntou: “Papai, por que parou de escrever?”, e “o que você está pensando agora, papai?”. Quando o pai começou a escrever de novo, ele indagou: “O que você está escrevendo, papai?”.

Finalmente, quando viu que seu pai o ignorava e que estava meio aborrecido com suas interrupções, desceu lentamente do banquinho em que se encontrava e disse baixinho: “Acho que vou deitar agora, papai”.

Foi então que o pai percebeu. Seu filho estava dizendo à sua moda: “Papai, tire um pouquinho de tempo para mim. Por favor, papai, converse comigo”.

Quando virava o canto da escada, o pai o chamou: “Joelzinho venha aqui, deixe papai segurar você antes de ir para a cama. Quero conversar com o meu garoto um pouco”.

Com um grande sorriso, ele veio. Depois de um pequeno tempo, quando ele foi para a cama, ficou pensando na frequência com que suas ocupações o levavam a perder oportunidades preciosas de compartilhar seu amor com seu filho.

O momento de amar é agora. Amanhã é tarde demais para balançar o nenê. Amanhã o pequenino não estará fazendo perguntas. Amanhã o escolar não precisará de ajuda com a lição de casa. Tampouco trará para casa seus amigos para participar das diversões da família.

Ele faz perguntas?

É hora de revelar nosso interesse, além de nossa utilidade.

Ele pede ajuda na lição do colégio?

É hora de alimentar esta confiança, e sua disposição.

Ele pede ajuda na lição da igreja?

É hora de mostrar que Deus é verdadeiramente importante.

Ele quer trazer os colegas para casa?

É hora de acostumá-lo no ambiente familiar.

Ele quer brincar conosco?

É hora de revelar nosso carinho, para que mais tarde ele faça o mesmo por nós.

Devemos ser construtores (formadores) e não deformadores de caráter. Esta é a ideia de Paulo no texto aos efésios: termos o cuidado de, como pais, não influenciar nossos filhos ao afastamento do Senhor. Não devemos ser responsáveis em provocar nossos filhos a uma vida que mereça o juízo de Deus; mas, ao contrário, a serem amigos do Senhor.

O Silêncio que antecede a ação

silencio

“Até quando, Senhor, clamarei eu, e tu não me escutarás? Gritar-te-ei: Violência! E não salvarás? Por que me mostras a iniquidade e me fazes ver a opressão? Pois a destruição e a violência estão diante de mim; há contendas, e o litígio se suscita. Por esta causa, a lei se afrouxa, e a justiça nunca se manifesta, porque o perverso cerca o justo, a justiça é torcida” (Habacuque 1.2-4).

 “Até quando, Senhor?” É uma tremenda ousadia! “Até quando o senhor vai ficar parado, sem fazer nada?”. Ele está perplexo com a demora de Deus em tomar uma decisão. Na realidade, não se trata de um desaforo, mas, sim de um profundo anseio por justiça. “Gritar-te-ei: Violência!”. O profeta está vendo a violência em seus dias. Sabe que Jeová é o Deus da justiça. No entanto, esta não se verifica. O profeta, identificado com os oprimidos, clama por socorro. O seu até quando é um grito de angústia.

O versículo três reflete bem a razão da angústia de Habacuque: “Iniquidade, opressão, destruição, violência, contendas e litígio”. O quadro não é animador. Sendo um profeta, Habacuque vê tudo e se aflige. Como Deus vê e fica impassível? Por que não interrompe o quadro, punindo de vez os transgressores?

“Por esta causa” (4), porque há iniquidade, opressão, destruição e violência e Deus está aparentemente omisso, a lei se afrouxa. O termo para “justiça” neste texto significa “julgamento”. Os julgamentos eram injustos, pois os juízes também estavam corrompidos. A corrupção da justiça é o caos em qualquer nação. É o mergulho na desordem total e o ponto final nas esperanças dos pobres.

Como seria bom se Deus interviesse! Se ele punisse os murmuradores com a morte, como fez com Corá, Datã e Abirão (em Números 16), por certo não haveria murmurações em nosso meio (ou, pelo menos, diminuiriam). Como seria bom se Deus punisse os mentirosos, como fez com Ananias e Safira em Atos 5. Não haveriam mentirosos em nossas igrejas; tampouco gente buscando a preeminência. Como seria bom se Deus punisse os criminosos, os bandidos e todos os que andam errados….. Mas, se Deus punisse com a morte todos os que erram, quem sobraria? Se Deus, em todo momento interviesse que espécie de mundo seria este? Qual seria o mérito da virtude, da persistência, e da fidelidade em meio à tribulação?

A queixa inicial de Habacuque em seu livro nos traz duas conclusões: E a primeira é a de que o povo de Deus também peca. E por vezes os seus pecados são desprezíveis. Não nos orgulhemos, presumindo-nos melhores que os do mundo. A grande diferença entre nós e eles é a graça de Cristo que opera em nós. Pois, muitos dos pecados que a igreja combate no mundo, ela os pratica.

Certa professora da EBD contou para os seus alunos a parábola do fariseu e do publicano (Lucas 18.10-14). Após contar a história, disse a professora: “Agora, meus filhinhos, vamos dar graças a Deus porque não somos como aquele fariseu!” Nem se deu conta que cometeu o mesmo pecado: a soberba de se presumir melhor que outros.

O fato de que somos pecadores e que o pecado é encontrado em nosso meio deve nos levar a cuidar bem de nossa vida e a não nos orgulharmos de nossas virtudes.

A segunda conclusão é a de que a fé nos leva a crer e a esperar por uma intervenção divina. Nem sempre a espera escatológica é escapismo e imobilismo. Pode significar que cremos em um Deus moral que pune o mal e que recompensa o bem. E é por isso que Habacuque se torna tão atraente: é que, como ele, nós também aguardamos ansiosos, o triunfo do bem sobre o mal. Aguardarmos a ação de Deus contra a manifestação do pecado, da injustiça.

Assim, não presumamos que o silêncio de Deus seja um indicativo de sua apatia, pois não o é, como observamos no estudo deste livro. O silêncio de Deus tem sido difícil de ser admitido; mas isso não quer dizer que não haja uma resposta e que a sabedoria divina é incapaz de lidar com a situação. Tudo está sob o seu olhar e todas as coisas estão debaixo de seu controle. Ele não se apavora nem se precipita.

Em toda a Bíblia, o silêncio de Deus antecede uma ação que varia entre juízo, bênção, e disciplina. A Habacuque Deus parecia apático porque não falava. Estava em silêncio. Mas, como se observa no desenrolar de sua narrativa, ele saiu do silêncio. Saiu para efetuar juízo.

Ele parece silencioso em nossos dias? O temos como apático, omisso? Lembremo-nos de que o seu silêncio precede sua ação. Se Deus está em silêncio é porque vem ação por aí.

O amor é qualificador

Best Friends

“O amor deixa as pessoas abobadas”. Já ouviu esta expressão, ou algo semelhante? A ideia é a de que o indivíduo que está amando não enxerga a realidade; isto é, não percebe os defeitos do outro, assim como as coisas erradas e ridículas que faz (ou fazem).

Li outro dia esta afirmação: “O amor realmente torna as pessoas fracas mesmo, veja as mulheres, ficam cegas e fazem loucuras e os homens (em menor grau) também fazem. Quem é bom e tem amor nunca chega ao poder é usado e abusado e nunca consegue ter o poder, pois é dominado por um sentimento que o torna fraco e inimigo de si mesmo, ficando assim na mão da pessoa a qual ele ama. O amor faz você se preocupar com os outros, e você acaba ficando em segundo plano. O amor faz você sair da realidade do mundo, e você acaba caindo na armadilha. O amor é a palavra que deram para o sexo em uma forma mais bonita pois o amor acaba”.

Maquiavel afirmou que um príncipe nunca deve demonstrar amor; pois o amor o torna fraco, e acaba; mas o medo das pessoas não. Ele tinha esta filosofia, e a maioria dos políticos, empresários de sucesso e grandes executivos seguem a mesma filosofia.

Que coisa! Será que tudo isso se refere realmente ao amor? Ou será que o sentimento em questão diz respeito a algo de menor proporção temporal, e qualitativa em seu todo; mas de acalorada proporção sentimental, como a paixão?

Vejamos o que as Escrituras revelam acerca do amor: “O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta” (1 Coríntios 13.4-7).

 Interessante, pois as características do amor na pessoa, como demonstrado no texto, parecem conduzir à qualificação pessoal. E isto, evidentemente, qualifica a pessoa para todas as coisas e áreas; pois, qual a parte da vida que o pessoal não está incluído, por meio do entendimento, da avaliação, das ações e reações, e dos relacionamentos?

Paciência, bondade; assim como não se ressentir do mal; não ser irritadiço, e prepotente, são características desejadas por todos; porém, com pouquíssimas conquistas. Para a maioria das pessoas são como utópicas; isto é, lindas e desejáveis, mas não alcançáveis.

E o que dizer do ter domínio próprio? Sim; pois, o amor qualifica a pessoa a não ser controlado pelo ciúme; assim como a não ser cego devido ao orgulho; bem como a não se conduzir inconvenientemente. O amor torna a pessoa justa, inimiga da injustiça e amiga da verdade. Enfim, o amor torna a pessoa forte o suficiente para sofrer, crer, esperar e suportar; vivendo equilibradamente segundo aquilo que crê.

E o mais interessante é que tudo isso tem uma consequência benéfica para a pessoa que ama. O texto afirma: “o amor não procura os seus interesses”. Ao contrário do que afirmam alguns, pensar e agir em benefício do outro traz benefício para o próprio agente do bem. Se eu amo minha esposa, e por isso me relaciono positivamente com ela, procurando os seus interesses; a recompensa é a de ser também amado; e por isso, cuidado por ela. Alguns certamente diriam: “Mas e quando eu amo e não sou correspondido, isto é, sou traído por aquela que foi alvo de meu amor?” Eu respondo, afirmando ser possível que isto aconteça devido a pecaminosidade existente; porém, na maioria das vezes eu indagaria: “Você realmente a amava, se relacionando com ela conforme as características expostas no texto acima?”. Na maioria das experiências negativas, percebe-se a ausência do amor real, com suas características não sendo evidenciadas, por nenhuma das partes. A consequência para estes relacionamentos, evidentemente, não pode ser boa.

Quando amamos verdadeiramente, evidenciando tais características, somos qualificados. E mesmo diante de alguma possível trairagem, somos fortalecidos a amar; pois nos tornamos pessoas melhores para nós mesmos, e para os outros. Por que será que diante de uma trairagem o lado desqualificado é que tem de prevalecer, influenciando negativamente? Afinal, aquele que não ama revela fraqueza e covardia, por meio de um caráter indigno, e de uma conduta inconveniente. Enquanto o que ama é qualificado a “tudo passar, tudo crer, tudo esperar e tudo suportar”. O amor qualifica; portanto, vale a pena amar.

Passos determinantes

passos-areiaPassos determinantes

Passos que desenham o viver

Para a vida de todo o que crê

Ser correto o andar vaidoso

Em busca de algo rendoso

O orgulho leva a ignorância

A ignorância a impaciência

A impaciência ao desamor

Finalizando no desprimor

Só um coração quebrantado

Transforma os passos do coitado

Produz a bela humildade

Conduzindo a suave unidade

Vivenciada pela mansidão

De quem foi alvo da compaixão

Wagner Amaral